PRIMEIRO SENTIDO DA MORTIFICAÇÃO: MATAR O “HOMEM
VELHO”
«Se não te
mortificas, nunca serás alma de oração» (São
Josemaria Escrivá).
Por quê? Porque
dentro de nós há, como diz São Paulo, duas forças opostas em contínua luta: o
“homem velho” e o “homem novo” (ver Ef 4,22-24). A Escritura logo chama nossa concupiscência de “homem velho”, oposto
ao “homem novo” que é Jesus que vive em nós e nós mesmos que vivemos em Jesus. O homem velho tem
um nome: “egoísmo”, fruto do pecado original e dos pecados pessoais. O homem
novo também tem um nome: “amor”, fruto da presença do Espírito Santo na alma e
da nossa correspondência.
Os dois “homens” são
como brigões que puxam de uma corda, cada um por um extremo, em sentido
contrário. Se o “velho” levar a melhor, arrasta-nos para longe de Cristo (pois
só a graça e o amor nos aproximam dEle). Mas toda vez que o “novo” vence
(”mortificando” o egoísmo), aproxima-nos de Deus, da amizade com Cristo, da união
com Ele.
Por isso, entende-se
bem que Jesus diga: «Se alguém quiser vir comigo, negue-se a si mesmo [negue o
"eu" egoísta], tome a sua cruz e siga-me» (Mt 16,24).
O “homem velho” ou esta carne deve ser, não digo
aniquilado, porque é coisa impossível enquanto dure a vida presente, mas sim mortificado, ou seja, reduzido praticamente
à impotência, à inércia e à esterilidade de um morto; há que impedir-lhe
que dê seu fruto, que é o pecado, e anular sua ação em toda a nossa vida moral.
SEGUNDO SENTIDO DA MORTIFICAÇÃO: REPARAR OS
PECADOS COMETIDOS
A mensagem de Fátima nos ajudará a
compreender este ponto:
Eis que
outro dia, pouco depois da primeira aparição angelical, quando as crianças
brincavam perto do poço que existia no quintal da casa da família, o mesmo Anjo
apareceu dizendo-lhes: "Que fazeis? Orai, orai muito. Os Corações
Santíssimos de Jesus e Maria têm sobre vós desígnios de misericórdia. Oferecei
constantemente ao Altíssimo orações e sacrifícios." Lúcia pergunta então
ao Anjo: "Como nos havemos de sacrificar?"; ao que foi respondida:
"De tudo que puderdes, oferecei a Deus um sacrifício em ato de reparação
pelos pecados com que Ele é ofendido e de súplica pela conversão dos pecadores."
Em outra aparição,
recomendou Nossa Senhora: "Sacrificai-vos pelos pecadores e dizei muitas
vezes, e em especial sempre que fizerdes algum sacrifício: Ó Jesus, é por Vosso amor, pela conversão dos pecadores, e em reparação
pelos pecados cometidos contra o Imaculado Coração de Maria".
Em
outra, dizia aos pastorinhos: “Rezai, rezai muito e fazei sacrifícios pelos
pecadores, que vão muitas almas para o inferno por não haver quem se sacrifique
e peça por elas”.
ALGUNS TIPOS DE MORTIFICAÇÃO
1º) A mortificação externa, a da ordem e
pontualidade na oração. É importante ter uma hora e um lugar fixos para a
oração e observá-los, mesmo que não tenhamos vontade nem facilidade (só
deixá-los se há “impossibilidade”).
«É preciso vencer -
diz São Josemaria Escrivá - a poltronaria, o falso critério de que a oração
pode esperar. Não adiemos nunca essa fonte de graças para amanhã. O tempo
oportuno é agora».
2º) A mortificação física da gula. Não faça
essa cara de estranheza. Sim, gula e oração têm muito a ver, como ensinavam os
cristãos dos primeiros séculos. Comer demais, além de fazer mal ao corpo,
enfraquece a alma e a torna “pesada”. No século V, o abade João Cassiano,
grande mestre da oração, escrevia: «O primeiro combate que devemos empreender é
contra o espírito de gula. A abstinência corporal não tem outra razão de ser
senão conduzir-nos à pureza do coração».
3º) A mortificação da imaginação. Não
podemos ter a imaginação à solta, ao longo do dia. Dizem que Santa Teresa de
Ávila chamava a imaginação de a “louca da casa”, o que é uma grande verdade;
quem não se acostuma a mortificar devaneios à toa, filminhos mentais sem
substância, depois, quando chega a hora da oração, sofre o bombardeio das
distrações: a imaginação solta as suas “bombas de fumaça” e não nos deixa fixar
a mente e o coração em Deus.
4º) A mortificação que purifica. São
Josemaria compara a nossa alma a um «pássaro que ainda tem as asas empastadas
de lama», e comenta que são necessários «muito calor do Céu [graça de Deus] e
esforços pessoais pequenos e constantes [mortificações], para arrancar esse
barro pegajoso das asas»
5) Finalmente, as mortificações necessárias
para cumprir a Vontade de Deus. A própria oração nos faz ver, quase sempre,
o que Deus quer de nós. Para dizer-lhe “sim”, teremos que dizer “não” a algum
gosto, plano ou prazer pessoal. Por exemplo, para não deixar de ir à Missa aos
domingos. Ou para participar de um apostolado ou de um trabalho social em favor
dos necessitados... As mortificações que elas exigem são as pontes por onde
passa o amor. Do outro lado da ponte da mortificação, feita com amor a Deus e
ao próximo, estão os braços e o coração aberto de Cristo Jesus. E, com ele,
está a alegria.
O JEJUM NA BÍBLIA
Na história da salvação
é frequente o convite a jejuar. Já nas primeiras páginas da Sagrada Escritura o
Senhor comanda que o homem se abstenha de comer o fruto proibido: «Podes comer
o fruto de todas as árvores do jardim; mas não comas o da árvore da ciência do
bem e do mal, porque, no dia em que o comeres, certamente morrerás» (Gn 2,
16-17). Comentando a ordem divina, São Basílio observa que «o jejum foi
ordenado no Paraíso», e «o primeiro mandamento neste sentido foi dado a Adão».
Dado que todos estamos entorpecidos pelo pecado e pelas suas consequências, o
jejum é-nos oferecido como um meio para restabelecer a amizade com o Senhor. Assim
fez Esdras antes da viagem de regresso do exílio à Terra Prometida, convidando
o povo reunido a jejuar «para nos humilhar – diz – diante do nosso Deus» (8,
21). O Onipotente ouviu a sua prece e garantiu os seus favores e a sua proteção.
O mesmo fizeram os habitantes de Ninive que, sensíveis ao apelo de Jonas ao
arrependimento, proclamaram, como testemunho da sua sinceridade, um jejum
dizendo: «Quem sabe se Deus não Se arrependerá, e acalmará o ardor da Sua ira,
de modo que não pereçamos?» (3, 9). Também então Deus viu as suas obras e os
poupou.
A PENITÊNCIA NO CÓDIGO DO DIREITO CANÔNICO
Cân. 1250 — Os dias e tempos de penitência na
Igreja universal são todas as sextas-feiras do ano e o tempo da Quaresma.
Cân. 1251 —
Guarde-se a abstinência de carne ou de outro alimento segundo as determinações
da Conferência episcopal, todas as sextas-feiras do ano, a não ser que
coincidam com algum dia enumerado entre as solenidades; a abstinência e o jejum na quarta-feira de Cinzas e na sexta-feira da
Paixão e Morte de Nosso Senhor Jesus Cristo.
Cân. 1252 — Estão obrigados à lei da abstinência os
que completaram catorze anos de idade; à lei do jejum estão sujeitos todos os
maiores de idade até terem começado os sessenta anos. Todavia os pastores de
almas e os pais procurem que, mesmo aqueles que, por motivo de idade menor não
estão obrigados à lei da abstinência e do jejum, sejam formados no sentido
genuíno da penitência.
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