Evangelho: João 6,41-51
"A
Liturgia da Palavra deste Domingo ainda está ligada ao evangelho da
multiplicação dos pães. Jesus reclama porque os judeus não quiseram compreender
o sinal da multiplicação. Claramente, ele afirma: “Eu sou o pão que desceu do
céu! Quem dele comer, nunca morrerá!”
Eis
aqui a grande revelação do Senhor! Os judeus só conseguem ver a superfície,
somente compreendem que ele é o filho de José; não percebem, não crêem que ele
vem do Pai, como alimento de nossa existência: ele é o sustento, o alimento da
nossa vida. Afinal, que é viver? Será simplesmente existir, respirar,
sobreviver, de qualquer modo, sem rumo, sem sentido, sem uma finalidade para a
existência? Que vida seria essa? Não uma existência assim, miserável, que vemos
tantos e tanto hoje vivendo? Pois bem, Jesus afirma que ele dá o sustento
verdadeiro à nossa vida; com ele, a vida tem sentido, tem rumo, tem razão de
ser; com ele, descobriremos porque vivemos, descobrimos de onde vimos e para
onde vamos, descobrimos que somos amados e somos fruto de um sonho de amor; com
ele, finalmente, temos a paz! “Eu sou o pão da vossa vida! Precisais mais de
mim que vosso corpo do pão de cada dia. Quem come desse pão que sou eu, isto é,
quem se alimenta de meu amor, de minhas palavras, de meu caminho, nunca viverá
uma vida de mentira, de ilusão, de morte; antes, viverá de verdade!
Para
ilustrar isso, basta pensarmos na situação de Elias, na primeira leitura de
hoje. Ele tinha matado os profetas de Baal no monte Carmelo. Jezabel, a rainha
idólatra, tinha prometido vingança e queria matá-lo. O profeta sentiu medo e
figiu, procurando esconder-se no deserto do Sinai para encontrar inspiração e
consolo no monte Horeb (outro nome para o monte Sinai), o Monte de Deus. E lá
vai Elias… Mas, o caminho longo, os dias quentes do deserto, a solidão, a
tensão da fuga, tudo isso traz desânimo e depressão ao profeta. A vida lhe
parece dura, amarga, sem sentido. Cansado, ele se rende e pede a morte: “Agora
basta, Senhor! Tira a minha vida,pois não sou melhor que meus pais… Sou igual a
todo mundo, não sou a palmatória do mundo… Cansei! Quero morrer!” Quantas vezes
somos como Elias, quantas vezes a existência nos pesa, o sentido da vida parece
se nos esconder, quantas vezes parece que apenas sobrevivemos, mas não temos
idéia para onde vai o caminho… O desengano do profeta é tão profundo que ele,
deprimido, cai no sono. E o Senhor envia-lhe um anjo: “’Levanta-te e come!’ E
ele viu junto à sua cabeça um pão assado… ‘Ainda tens um longo caminho a
percorrer’. Elias levantou-se, comeu e bebeu e, com a força desse alimento,
andou quarenta dias e quarenta noites, até chegar ao Horeb, o monte de Deus”.
Caríssimos, também nós estamos a caminho, também nós precisamos de um pão como
o de Elias. Esse pão o Senhor nos dá, esse pão é o próprio Cristo, que hoje nos
diz: “Eu sou o pão da vossa vida!” Infelizmente para nós, caríssimos, nos
iludimos, procurando saciar nossa fome de vida com coisas que não alimentam o
coração. É aquela antiga queixa de Deus, pela boca do profeta Isaías: “Ah!
Todos que tendes sede, vinde à água. Vós, os que não tendes dinheiro, vinde,
comprai e comei; comprai sem dinheiro e sem pagar, vinho e leite. Por que
gastais dinheiro com aquilo que não é pão, e o produto do vosso trabalho com
aquilo que não pode satisfazer? Ouvi-me com toda atenção e comei o que é bom.
Escutai e vinde a mim, ouvi-me e havereis de viver!” (Is 55,1-3)
Mas,
o Senhor é bondoso e sua misericórdia é sem limites! Quem pode pôr medida à sua
bondade? Ele não somente é pão e sustento de nossa vida de modo figurado. Para
surpresa nossa, para escândalo do mundo – e até de tantos cristãos que estão
separados da Igreja de Cristo – o Senhor revela: “O pão que eu darei é a minha
carne para a vida do mundo!” É demais, caríssimos! É surpreendente, é
inesperado! Aqui, o Senhor está falando claramente da Eucaristia: “Eu sou o pão
da vossa vida, eu vos alimento de vida e de sentido de viver; e eu fico entre
vós, fico convosco, alimento-vos de um modo que não esperáveis: minha união
convosco é total, absoluta: eu vos dou verdadeiramente minha carne, meu corpo
morto e ressuscitado, como vida da vossa vida!” Meus irmãos, não pode haver
maior dom, maior intimidade, mais revigorante alimento! Os judeus murmuravam,
os protestantes murmuram, mas Cristo nosso Deus, que tem palavras de vida
eterna e para quem nada é impossível, nos garante: “O pão que eu darei é a
minha carne para a vida do mundo!” Caríssimos, estejamos atentos para nos
aproximar freqüentemente desse alimento de vida eterna; com freqüência e com
dignidade. Privar-se da comunhão eucarística quando se poderia comungar é fazer
pouco caso do dom do Senhor, é ser auto-suficiente, é não reconhecer que
somente Jesus nos alimenta e nos sustém com a sua graça. Não cuidar de comungar
é um orgulho que nos coloca debaixo da terrível sentença do nosso Salvador: “Se
não comerdes a carne do Filho do Homem e não beberdes do seu sangue, não tereis
a vida em vós!” (Jo 6,53). Por outro lado, aproximar-se do Corpo do Senhor sem
se examinar; comungar sem estar em comunhão com o Senhor e com os irmãos é
mentir contra a Eucaristia, é comer e beber a própria condenação! Comunguemos
sempre, caríssimos; mas, comunguemos estando preparados, conforme a santa
Palavra de Deus nos exorta! Recordemos a grave palavra do Apóstolo: “Que cada
um se examine a si mesmo antes de comer desse pão e beber desse cálice, pois
aquele que come e bebe sem discernir o Corpo come e bebe a própria condenação”
(1Cor 11,28s).
Meus
caros, a Eucaristia, comunhão no santíssimo Corpo do Senhor, não somente é
alimento para o nosso caminho, não somente á sustento da nossa vida, não
somente é penhor de vida eterna, como também nos dá a graça do Santo Espírito,
que nos faz ser um só corpo em
Cristo. Eis , que mistério tão profundo: comungando do Corpo
do Senhor na Eucaristia, nós nos tornamos cada vez mais unidos no corpo do
Senhor, que é a Igreja! Comunguemos, pois, e teremos força para viver o belo
caminho que a segunda leitura deste hoje nos aponta: “Vivei no amor, como
Cristo nos amou e se entregou a si mesmo a Deus por nós, em oblação e
sacrifício de suave odor”. Eis aqui: a nossa participação no sacrifício
eucarístico de Cristo, a nossa comunhão no seu corpo sacrificado e entregue
amorosamente, devem nos levar a um novo modo de viver, um modo que consiste na
docilidade ao Espírito do Senhor morto e ressuscitado, que significa comunhão
com Deus e com os irmãos: “Sede bons uns para com os outros, sede compassivos;
perdoai-vos mutuamente, como Deus vos perdoou por meio de Cristo”.
Portanto,
seja Cristo, que se oferece por nós em sacrifício e se dá a nós em comunhão, o
pão, o sustento, o sentido da nossa vida, para podermos caminhar, entre as
lutas, desafios e cansaços desta vida, até o monte de Deus, que é a Pátria
celeste. Amém.
Dele
alimentar-se é iniciar uma nova vida, vivendo sua dinâmica de entrega: vivei em
amor como ele nos amou e se entregou por nós em sacrifício (2l)."
(Dom Henrique Soares da Costa)
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