quarta-feira, 23 de maio de 2012

REC – Reflexões e Estudos CATÓLICOS (23/05/2012) - Tema: FORA DA IGREJA NÃO HÁ SALVAÇÃO


“Onde está Pedro, está a Igreja; onde está a Igreja, está Cristo”.



DIFICULDADES ENCONTRADAS PARA A ACEITAÇÃO DE UMA VERDADE ABSOLUTA

 
O perene anúncio missionário da Igreja é hoje posto em causa por teorias de índole relativista, que pretendem justificar o pluralismo religioso. Daí que se considerem superadas, por exemplo, verdades como:

- o caráter definitivo e completo da revelação de Jesus Cristo,

- o caráter inspirado dos livros da Sagrada Escritura,

- a unidade pessoal entre o Verbo eterno e Jesus de Nazaré,

- a unicidade e universalidade salvífica do mistério de Jesus Cristo,

- a mediação salvífica universal da Igreja,

- a não separação, embora com distinção, do Reino de Deus, Reino de Cristo e Igreja,

- a subsistência na Igreja Católica da única Igreja de Cristo.


Na raiz destas afirmações encontram-se certos pressupostos, de natureza tanto filosófica como teológica, que dificultam a compreensão e a aceitação da verdade revelada. Podem indicar-se alguns:

- a convicção de não se poder alcançar nem exprimir a verdade divina, nem mesmo através da revelação cristã;

- uma atitude relativista perante a verdade, segundo a qual, o que é verdadeiro para alguns não o é para outros;

- a dificuldade de ver e aceitar na história a presença de acontecimentos definitivos;

- a tendência, enfim, a ler e interpretar a Sagrada Escritura à margem da Tradição e do Magistério da Igreja.


Na base destes pressupostos, que se apresentam com matizes diferentes, por vezes como afirmações e outras vezes como hipóteses, elaboram-se propostas teológicas, em que a revelação cristã e o mistério de Jesus Cristo e da Igreja perdem o seu caráter de verdade absoluta e de universalidade salvífica, ou ao menos se projeta sobre elas uma sombra de dúvida e de insegurança.


DEUS SE REVELA DE MANEIRA PLENA E DEFINITIVA POR MEIO DE JESUS CRISTO


É contrária à fé da Igreja a tese que defende o caráter limitado, incompleto e imperfeito da revelação de Jesus Cristo, que seria complementar da que é presente nas outras religiões.

A verdade sobre Deus não é abolida nem diminuída pelo fato que é proferida numa linguagem humana. É, invés, única, plena e completa, porque quem fala e atua é o Filho de Deus Encarnado. Daí a exigência da fé em se professar que o Verbo feito carne é, em todo o seu mistério que vai da encarnação à glorificação, a fonte, participada mas real, e a consumação de toda a revelação salvífica de Deus à humanidade, e que o Espírito Santo, que é o Espírito de Cristo, ensinará aos Apóstolos e, por meio deles, à Igreja inteira de todos os tempos, esta « verdade total » (Jo 16, 13).

Por isso, o Concílio Vaticano II, referindo-se aos modos de agir, aos preceitos e doutrinas das outras religiões, afirma que, « embora em muitos pontos estejam em discordância com aquilo que [a Igreja] afirma e ensina, muitas vezes refletem um raio daquela Verdade, que ilumina todos os homens ».


DONDE VEM A NECESSIDADE DA IGREJA PARA NOSSA SALVAÇÃO


O Senhor Jesus, único Salvador, não formou uma simples comunidade de discípulos, mas constituiu a Igreja como mistério salvífico: Ele mesmo está na Igreja e a Igreja n'Ele (cf. Jo 15,1ss.; Gal 3,28; Ef 4,15-16; Atos 9,5); por isso, a plenitude do mistério salvífico de Cristo pertence também à Igreja, unida de modo inseparável ao seu Senhor. Jesus Cristo, com efeito, continua a estar presente e a operar a salvação na Igreja e através da Igreja (cf. Col 1,24-27), que é o seu Corpo (cf. 1 Cor 12,12-13.27; Col 1,18). E, assim como a cabeça e os membros de um corpo vivo, embora não se identifiquem, são inseparáveis, Cristo e a Igreja não podem confundir-se nem mesmo separar-se, constituindo um único « Cristo total ». Uma tal inseparabilidade é expressa no Novo Testamento também com a analogia da Igreja Esposa de Cristo (cf. 2 Cor 11,2; Ef 5,25-29; Ap 21,2.9).

Assim, e em relação com a unicidade e universalidade da mediação salvífica de Jesus Cristo, deve crer-se firmemente como verdade de fé católica a unicidade da Igreja por Ele fundada. Como existe um só Cristo, também existe um só seu Corpo e uma só sua Esposa: « uma só Igreja católica e apostólica ». Por outro lado, as promessas do Senhor de nunca abandonar a sua Igreja (cf. Mt 16,18; 28,20) e de guiá-la com o seu Espírito (cf. Jo 16,13) comportam que, segundo a fé católica, a unicidade e unidade, bem como tudo o que concerne a integridade da Igreja, jamais virão a faltar.

Os fiéis são obrigados a professar que existe uma continuidade histórica — radicada na sucessão apostólica — entre a Igreja fundada por Cristo e a Igreja Católica: « Esta é a única Igreja de Cristo [...] que o nosso Salvador, depois da sua ressurreição, confiou a Pedro para apascentar (cf. Jo 21,17), encarregando-o a Ele e aos demais Apóstolos de a difundirem e de a governarem (cf. Mt 28,18ss.); levantando-a para sempre como coluna e esteio da verdade (cf. 1 Tim 3,15). Esta Igreja, como sociedade constituída e organizada neste mundo, subsiste na Igreja Católica, governada pelo Sucessor de Pedro e pelos Bispos em comunhão com ele ».


Afirma o Vaticano II:

- A Igreja de Cristo, não obstante as divisões dos cristãos, continua a existir plenamente só na Igreja Católica

- Existem numerosos elementos de santificação e de verdade fora da sua composição , isto é, nas Igrejas e Comunidades eclesiais que ainda não vivem em plena comunhão com a Igreja Católica. Acerca destas, porém, deve afirmar-se que « o seu valor deriva da mesma plenitude da graça e da verdade que foi confiada à Igreja Católica ».

Existe, portanto, uma única Igreja de Cristo, que subsiste na Igreja Católica, governada pelo Sucessor de Pedro e pelos Bispos em comunhão com ele. As Igrejas que, embora não estando em perfeita comunhão com a Igreja Católica, se mantêm unidas a esta por vínculos estreitíssimos, como são a sucessão apostólica e uma válida Eucaristia, são verdadeiras Igrejas particulares. Por isso, também nestas Igrejas está presente e atua a Igreja de Cristo, embora lhes falte a plena comunhão com a Igreja católica, enquanto não aceitam a doutrina católica do Primado que, por vontade de Deus, o Bispo de Roma objetivamente tem e exerce sobre toda a Igreja.

As Comunidades eclesiais, invés, que não conservaram um válido episcopado e a genuína e íntegra substância do mistério eucarístico, não são Igrejas em sentido próprio. Os que, porém, foram batizados nestas Comunidades estão pelo Batismo incorporados em Cristo e, portanto, vivem numa certa comunhão, se bem que imperfeita, com a Igreja.


Antes de mais, deve crer-se firmemente que a « Igreja, peregrina na terra, é necessária para a salvação. Só Cristo é mediador e caminho de salvação; ora, Ele torna-se-nos presente no seu Corpo que é a Igreja; e, ao inculcar por palavras explícitas a necessidade da fé e do Batismo (cf. Mc 16,16; Jo 3,5), corroborou ao mesmo tempo a necessidade da Igreja, na qual os homens entram pelo Batismo tal como por uma porta ». Esta doutrina não se contrapõe à vontade salvífica universal de Deus (cf. 1 Tim 2,4); daí « a necessidade de manter unidas estas duas verdades: a real possibilidade de salvação em Cristo para todos os homens, e a necessidade da Igreja para essa salvação ».

A Igreja é « sacramento universal de salvação », porque, sempre unida de modo misterioso e subordinada a Jesus Cristo Salvador, sua Cabeça, tem no plano de Deus uma relação imprescindível com a salvação de cada homem. Para aqueles que não são formal e visivelmente membros da Igreja, « a salvação de Cristo torna-se acessível em virtude de uma graça que, embora dotada de uma misteriosa relação com a Igreja, todavia não os introduz formalmente nela, mas ilumina convenientemente a sua situação interior e ambiental. Esta graça provém de Cristo, é fruto do seu sacrifício e é comunicada pelo Espírito Santo ». Tem uma relação com a Igreja, que por sua vez « tem a sua origem na missão do Filho e na missão do Espírito Santo, segundo o desígnio de Deus Pai ».


O PERIGO DO RELATIVISMO RELIGIOSO


Com a vinda de Jesus Cristo Salvador, Deus quis que a Igreja por Ele fundada fosse o instrumento de salvação para toda a humanidade (cf. At 17,30-31). Esta verdade de fé nada tira ao fato de a Igreja nutrir pelas religiões do mundo um sincero respeito, mas, ao mesmo tempo, exclui de forma radical a mentalidade indiferentista « imbuída de um relativismo religioso que leva a pensar que “tanto vale uma religião como outra” ». Se é verdade que os adeptos das outras religiões podem receber a graça divina, também é verdade que objetivamente se encontram numa situação gravemente deficitária, se comparada com a daqueles que na Igreja têm a plenitude dos meios de salvação. Há que lembrar, todavia, « a todos os filhos da Igreja que a grandeza da sua condição não é para atribuir aos próprios méritos, mas a uma graça especial de Cristo; se não corresponderem a essa graça, por pensamentos, palavras e obras, em vez de se salvarem, incorrerão num juízo mais severo ». Pelo que, não se poderiam salvar aqueles que, não ignorando ter sido a Igreja católica fundada por Deus, por meio de Jesus Cristo, como necessária, contudo, ou não querem entrar nela ou nela não querem perseverar.

Compreende-se, portanto, que, em obediência ao mandato do Senhor (cf. Mt 28,19-20) e como exigência do amor para com todos os homens, a Igreja « anuncia e tem o dever de anunciar constantemente a Cristo, que é “o caminho, a verdade e a vida” (Jo 14,6), no qual os homens encontram a plenitude da vida religiosa e no qual Deus reconciliou todas as coisas consigo ».


(Declaração Dominus Iesus, da Congregação para a Doutrina da Fé, que tinha como prefeito da época o então Cardeal Joseph Ratzinger)


RELAÇÃO DA IGREJA COM OS CRISTÃOS NÃO-CATÓLICOS


Por isso, as Igrejas e Comunidades separadas, embora creiamos que tenham defeitos, de forma alguma estão despojadas de sentido e de significação no mistério da salvação. Pois o Espírito de Cristo não recusa servir-se delas como de meios de salvação cuja virtude deriva da própria plenitude de graça e verdade confiada à Igreja Católica.

Com efeito, os elementos de santificação e de verdade presentes nas outras Comunidades cristãs, em grau variável duma para outra, constituem a base objetiva da comunhão, ainda imperfeita, que existe entre elas e a Igreja Católica.

Na medida em que tais elementos se encontram nas outras Comunidades cristãs, a única Igreja de Cristo tem nelas uma presença operante.


Já desde agora, é possível individuar os argumentos que ocorre aprofundar para se alcançar um verdadeiro consenso de fé:

1) as relações entre Sagrada Escritura, suprema autoridade em matéria de fé, e a Sagrada Tradição, indispensável interpretação da palavra de Deus;

2) a Eucaristia, sacramento do Corpo e do Sangue de Cristo, oferta de louvor ao Pai, memória sacrifical e presença real de Cristo, efusão santificadora do Espírito Santo;

3) a Ordem, como sacramento, para o tríplice ministério do episcopado, do presbiterado e do diaconado;

4) o Magistério da Igreja, confiado ao Papa e aos Bispos em comunhão com ele, concebido como responsabilidade e autoridade em nome de Cristo para o ensino e preservação da fé;

5) a Virgem Maria, Mãe de Deus e Ícone da Igreja, Mãe espiritual que intercede pelos discípulos de Cristo e pela humanidade inteira.


(João Paulo II, Ut unum sint, sobre o Empenho Ecumênico)


RELAÇÃO DA IGREJA COM OS NÃO-CRISTÃOS


Finalmente, aqueles que ainda não receberam o Evangelho, estão de uma forma ou outra orientados para o Povo de Deus. Em primeiro lugar, aquele povo que recebeu a aliança e as promessas, e do qual nasceu Cristo segundo a carne (cfr. Rom. 9, 4-5), povo que segundo a eleição é muito amado, por causa dos Patriarcas, já que os dons e o chamamento de Deus são irrevogáveis (cfr. Rom. 11, 28-29). Mas o desígnio da salvação estende-se também àqueles que reconhecem o Criador, entre os quais vêm em primeiro lugar os muçulmanos, que professam seguir a fé de Abraão, e conosco adoram o Deus único e misericordioso, que há-de julgar os homens no último dia. E o mesmo Senhor nem sequer está longe daqueles que buscam, na sombra e em imagens, o Deus que ainda desconhecem; já que é Ele quem a todos dá vida, respiração e tudo o mais e, como Salvador, quer que todos os homens se salvem (cfr. 1 Tim. 2,4). Com efeito, aqueles que, ignorando sem culpa o Evangelho de Cristo, e a Sua Igreja, procuram, contudo, a Deus com coração sincero, e se esforçam, sob o influxo da graça, por cumprir a Sua vontade, manifestada pelo ditame da consciência, também eles podem alcançar a salvação eterna. Nem a divina Providência nega os auxílios necessários à salvação àqueles que, sem culpa, não chegaram ainda ao conhecimento explícito de Deus e se esforçam, não sem o auxílio da graça, por levar uma vida reta. Tudo o que de bom e verdadeiro neles há, é considerado pela Igreja como preparação para receberem o Evangelho, dado por Aquele que ilumina todos os homens, para que possuam finalmente a vida. Mas, muitas vezes, os homens, enganados pelo demônio, desorientam-se em seus pensamentos e trocam a verdade de Deus pela mentira, servindo a criatura de preferência ao Criador, ou então, vivendo e morrendo sem Deus neste mundo, se expõem à desesperação final.

Por isso, para promover a glória de Deus e a salvação de todos estes, a Igreja, lembrada do mandato do Senhor: «pregai o Evangelho a toda a criatura» (Mc. 16,16), procura zelosamente impulsionar as missões.


(Constituição Dogmática Lumen Gentium sobre a Igreja, Papa Paulo VI)


“Quem se aparta da confissão da verdade, muda de caminho e o percurso inteiro se torna afastamento. Tanto mais próximo da morte estará quanto mais distante da luz católica.”
(São Leão Magno, papa e doutor da Igreja)







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